Uma das realidades mais desafiadoras que a humanidade enfrenta são as mudanças climáticas, e a América Latina está entre as regiões mais vulneráveis devido à sua capacidade limitada de adaptação e resposta.
O que antes eram histórias distantes de secas ou inundações agora são histórias cotidianas. Famílias inteiras empacotam o pouco que lhes resta, crianças abandonam a escola porque não há mais água e comunidades ancestrais desaparecem do mapa após um furacão ou um rio que seca. A migração climática já está aqui, mas continuamos a tratá-la como um problema do futuro.
Os números são cada vez mais alarmantes e, em muitos casos, ignorados. O Banco Mundial estima que, até 2050, 17 milhões de latino-americanos poderão ser forçados a se mudar dentro de seus países devido a causas relacionadas ao clima. Mas os deslocados estão mais perto do que imaginamos: são os agricultores do Corredor Seco da América Central, onde as colheitas foram reduzidas pela metade na última década; Eles são os pescadores de Chiloé, Chile, cujas praias estão desaparecendo devido à erosão costeira; e são os indígenas Wayúu, em La Guajira, que caminham durante dias em busca de um poço de água.
Em 2020, os furacões Eta e Iota não só devastaram cidades inteiras em Honduras e Nicarágua, mas também serviram de lição sobre a rapidez e a devastação das mudanças climáticas. Meio milhão de pessoas foram deslocadas, muitas delas amontoadas em cidades que não conseguiam mais absorver mais população, agravando seus problemas ambientais, sociais, políticos e econômicos.
Um dos aspectos mais críticos desta crise é a falta de reconhecimento legal dos migrantes climáticos. Atualmente, não há proteção internacional para aqueles forçados a fugir devido a desastres ambientais. Ao contrário dos refugiados políticos, os refugiados climáticos não têm status legal que lhes garanta direitos e assistência. Enquanto a Europa debate acordos para realocar os afetados por desastres naturais, na América Latina a questão continua obscura e pouco clara. Quantos governos incorporaram o deslocamento climático em suas políticas de migração? Quase nenhum.
Ainda mais preocupante é a falta de preparação das cidades para receber esses migrantes. A América Latina enfrenta um problema que cresce mais rápido que sua capacidade urbana: 30% de sua população já vive em assentamentos precários (ONU-Habitat, 2023), e milhares de outros chegam todos os anos, impulsionados por secas, inundações e furacões.
Os números falam por si: Lima, uma cidade desértica, recebe 40.000 migrantes climáticos anualmente, enquanto 40% de sua população luta para ter acesso à água (INEI, 2023). Bogotá enfrenta a pressão de 1,2 milhão de deslocados e um déficit de 320.000 moradias (ACNUR, 2023). A Cidade do México, por sua vez, está afundando enquanto absorve agricultores de áreas secas, extraindo 60% de sua água de fontes superexploradas (UNAM, 2023).
O resultado é um coquetel explosivo: 80% desses migrantes acabam em favelas, 25% dos seus jovens são recrutados por gangues e 60% dos conflitos sociais estão relacionados à escassez de recursos. As cidades latino-americanas não estão esperando o impacto climático: elas já estão sentindo os efeitos. A questão é quanto tempo mais eles conseguirão resistir.
É urgente agir. São necessários processos de reconhecimento legal para a proteção temporária de pessoas deslocadas pelo clima, bem como financiamento para adaptação, prevenção e gestão de riscos, bem como políticas que priorizem os direitos humanos daqueles que perderam suas casas devido às mudanças climáticas.
A América Latina tem uma escolha: agir agora com políticas claras ou esperar que a crise climática se torne a maior catástrofe humanitária em nossa região. A hora de decidir é hoje.
Fonte: Angie Tatiana Ortega Ramírez, professora do programa de Engenharia Química da Universidade da América.